O economista canadense John Helliwell contou este episódio numa palestra em São Paulo sobre Felicidade Interna Bruta.
Algumas pessoas foram convidadas a participar de uma pesquisa e, como presente pela colaboração, ganhariam uma viagem de vários dias. Elas responderam um questionário com várias perguntas e em seguida viajaram. Sem que os participantes soubessem, o que estava sendo estudado era seu comportamento durante a viagem.
Um dos grupos ganhou uma viagem para, digamos, Fortaleza. Outro, ganhou uma viagem para, digamos, Paris. Um terceiro grupo pôde escolher entre esses dois destinos: alguns escolheram Fortaleza e outros escolheram Paris.
Aqueles que não puderam escolher embarcaram para o destino determinado pelos organizadores, Paris ou Fortaleza. Divertiram-se do começo ao fim da viagem, acharam tudo o máximo e voltaram para casa muito felizes.
Os que escolheram Paris estavam muito felizes quando lá desembarcaram mas, lá pela metade da viagem, começaram a se questionar se não teria sido melhor escolher Fortaleza, pois lá não estariam passando tanto frio, encontrariam gente que fala a mesma língua e, afinal, comer um peixe olhando para o mar é muito mais divertido que andar de metrô e ir a museus.
Enquanto isso, os participantes que escolheram Fortaleza ficaram encantados quando chegaram àquelas praia maravilhosas. Porém, passados alguns dias, começaram a se perguntar se Paris não estaria mais interessante, com todo o seu charme à noite, as compras que poderiam fazer e, afinal, não é todo dia que se pode viajar para a Europa, enquanto que praias lindas existem pelo Brasil inteiro.
Quem teve a oportunidade de escolher acabou carregando, além de toda a bagagem, o peso dessa escolha, que nada mais é do que o peso da alternativa que deixou de escolher. Foi tão pesado que estragou parte da viagem.
O fato de saber que poderia ter escolhido a outra opção fica ali, quieto, num canto da memória. De repente, começa a rondar o pensamento com tanta força que tira a atenção da pessoa de tudo que está acontecendo ali, naquele momento presente que a pessoa está (ou deveria estar) vivendo.
Aquilo que a pessoa tem já não pode mais satisfazê-la, e ela já começa a antecipar o próximo ato de consumo.
A sociedade de consumo se orgulha de oferecer aos seus membros — os consumidores — a tão sagrada liberdade de escolha. Naturalmente estamos falando da liberdade entre consumir isto ou consumir aquilo. Conta vantagem em relação a outras sociedades, chamando-as de menos desenvolvidas, pois lá existiria menos liberdade. Fala inclusive de seu próprio passado, de um tempo em que “nossos avós não tinham tantas opções”, alegrando-se por ter superado esses “tempos difíceis”.
Saturar os consumidores com tantas opções de escolha é, por si só, um importante mecanismo de criação de desejos nesta sociedade (além, evidentemente, de todas as formas de propaganda, incluindo aquela feita pela rede social próxima da pessoa, sem qualquer custo para a empresa). Só saber que há tantas alternativas já cria no consumidor a sensação de “nunca está suficiente”.
Em suas palestras, John Helliwell salienta que a felicidade não está ligada à liberdade de fazer escolhas mercadológicas, mas sim à “liberdade de fazer escolhas relevantes na vida”.
Fico feliz que as pessoas tenham a liberdade de traçar o seu projeto de vida, mesmo sabendo que muitas escolherão passar a vida dentro de um automóvel.
E fico feliz, sobretudo, por eu ter a liberdade de escolher uma vida diferente.