Polos geradores de tráfego são, na definição do DENATRAN, “empreendimentos de grande porte que atraem ou produzem grande número de viagens, causando reflexos negativos na circulação viária em seu entorno imediato e, em certos casos, prejudicando a acessibilidade de toda a região”.
Alguns exemplos tradicionais de polos geradores de tráfego: supermercados, shopping centers, universidades, estádios, casas de espetáculos. Passe perto de um desses locais em horário de grande movimento e verá o que acontece com o trânsito no seu entorno.
Mas nos últimos anos, temos observado que escolas privadas têm se transformado também em verdadeiros polos geradores de tráfego, ainda que não sejam considerados como tais pelo agente de trânsito. As vias da vizinhança ficam totalmente congestionadas nos horários de entrada e saída dos alunos.
Algumas escolas chegam a apropriar-se de uma das faixas da via para organizar a enorme fila de carros que, às vezes, vira a esquina. Os carros são cada vez maiores, mais opacos e mais blindados. Como carros-fortes chegando num banco, fazem o embarque e desembarque de forma rápida e furtiva, com o auxílio de funcionários da escola.
Toda essa cena é mais uma evidência de um fato bem conhecido: em certos ambientes sociais, é cada vez mais raro que a criança vá à escola a pé.
Especialmente em algumas escolas, a relação ‘automóvel por aluno’ chega perto de 1. E se não chega, isso provavelmente é porque algumas famílias levam mais de um filho na mesma viagem.
Em muitos casos, vai-se de carro para a escola porque a escola fica longe de casa. E é verdade que há (sempre haverá) motivos para explicar a escolha de uma escola distante o suficiente para inviabilizar o deslocamento a pé. Pode haver boas razões pedagógicas para isso, mas muitas vezes pode haver também questões sociais e econômicas disfarçadas de questões pedagógicas.
Mas há também aquelas crianças que são levadas de carro a uma escola que fica a dois ou três quarteirões de casa. Aqui, os motivos costumam ser de outra natureza: economizar tempo, aproveitar a ida ao supermercado ou a volta do trabalho, alguma dor física ou dificuldade de locomoção. E, camuflado por trás destas racionalizações, o bom e velho medo de sair pela rua sem a proteção do carro.
É muito triste que essas crianças sejam privadas, desde muito cedo, do contato com a rua, seus sons e seus cheiros, as expressões de pessoas diferentes. São impedidas de ver os pequenos detalhes do caminho, as cores das folhas e flores que forram a calçada, a passagem das estações manifestada no céu e nas árvores, um buraco que aparece ou é consertado e todas as mudanças que vão acontecendo na paisagem pois, afinal, a cidade é viva.
Talvez pior que tudo isso, ao depender de um carro para ir e voltar da escola, essas crianças perdem autonomia e oportunidades valiosas de sociabilização e de contato com a diversidade humana da cidade. Os grupos sociais estão cada vez mais isolados e impermeáveis.
Nessas condições, a escola deixa de ter o importante papel comunitário local que já teve e se transforma em mais um gerador de viagens motorizadas.
Mais uma evidência de que é o projeto de vida que determina o trânsito, e não o contrário.
=== ATUALIZAÇÃO em junho/2016 ===
Este lindo curta-metragem Caminhando com Tim Tim mostra com delicadeza a vivência da qual são privadas essas crianças que, devido aos medos e/ou aos hábitos dos pais, passam a infância sem saber o que é caminhar pela rua.