mais congestionamentos

Serviços como ubers e similares aumentam os congestionamentos.

Mas como isso é possível, se estamos falando de um passageiro que deixou o carro em casa ou, eventualmente, nem carro tem? Esse tipo de transporte, assim como o taxi, não é uma alternativa bem mais sustentável que o carro particular?

foto: Oswaldo Corneti / Fotos Públicas

Parece que estamos diante de um fenômeno cuja explicação contraria a intuição. E a confusão já começa nessas perguntas, pois elas carregam as crenças que as pessoas usam para justificar o uso desse tipo de transporte. Em alguns casos, usam socialmente essas afirmações como uma demonstração de que são modernas e preocupadas com a qualidade de vida de todos na cidade.

A explicação desse misterioso fenômeno é muito simples. Congestionamentos são causados por transporte motorizado individual. Taxis, ubers e similares são transporte motorizado individual. Portanto taxis, ubers e similares causam congestionamentos. O número de taxis, ubers e similares vem aumentando. Portanto, congestionamentos vêm aumentando.

Você andava de carro. Agora você vendeu seu carro (ou prefere deixá-lo em casa) e usa o Uber. Você continua dentro de um carro, percebe? O seu deslocamento ocupa rigorosamente o mesmo espaço na via, naquele mesmo horário.

Até aqui, ocupando o mesmo espaço, dá para entender que os congestionamentos continuem iguais. Mas estão dizendo que eles aumentam. Como pode?

Esses serviços são de fato muito usados em substituição ao carro próprio, mas eles são também usados no lugar do metrô, do trem, do ônibus, da bicicleta e até da caminhada. Ou seja, eles tiram pessoas de outros modais e as colocam dentro de um carro.

Viagens que seriam feitas por algum outro meio de transporte passam a ser, diante da oportunidade, feitas por essa forma de transporte motorizado individual. A simples possibilidade de ir de carro até o destino, com motorista particular e todo conforto, acaba muitas vezes sendo decisiva na escolha. A pessoa fica dispensada do esforço de ter que andar um pouco e de ter que dividir com estranhos o mesmo espaço. A pressa permanente, característica das grandes cidades, ou então qualquer ventinho frio ou chuvinha, aparecem para resolver uma eventual hesitação.

Há pesquisas atestando esses fatos. Um exemplo é o estudo feito na área metropolitana de Boston. Dos passageiros de ubers e similares que participaram da pesquisa, 42% afirmaram que teriam usado transporte coletivo, 12% teriam caminhado ou ido de bicicleta e 5% simplesmente não teriam feito a viagem, caso não existisse essa forma de serviço. Ou seja, 59% dessas viagens correspondem a automóveis que foram adicionados ao sistema viário.

fonte: Metropolitan Area Planning Council – Boston

Evidentemente os números podem ser bem diferentes nas cidades brasileiras. Porém as razões são as mesmas, as escolhas funcionam do mesmo jeito.

Mas e o custo, que é certamente maior que o de qualquer um dos outros modais mencionados? Bem, pelo jeito isso não é um problema para quem usa, certo? O número de usuários desses sistemas mostra que a quantidade de pessoas sem esse tipo de preocupação é grande o suficiente para alimentar a demanda, que aliás não para de crescer. Talvez nem todos estejam tão bem de vida assim, mas a vantagem percebida em relação aos outros modais parece suficiente para que elas continuem desembolsando um pouco mais para ir de carro com motorista particular.

Com a demanda crescente, mais e mais pessoas começam a prestar serviços dentro do sistema, tornando-se motoristas. Veem nele, e de fato encontram, uma garantia de trabalho e rendimentos imediatos. Muitos alugam o carro para trabalhar, e se isso acontece é porque os ganhos diários superam com folga as diárias de locação. Percebendo também um aumento da demanda, as locadoras reforçam suas frotas.

Ou seja: a indústria automobilística vai muito bem, obrigado. Seus produtos continuarão entupindo as vias, ocupando um espaço público cada vez mais escasso. As pessoas continuarão dentro de bolhas de aço, os congestionamentos aumentando.

E o ponto da virada segue fora do alcance dos olhos.

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